A propósito da morte de Gomes Amaro e da emoção da rádio

 


Dava pelo nome de 'Tribunal' e ia para o ar ao domingo à noite, às 23 horas, e só terminava no dia seguinte, à uma hora.

Desidério Gomes Amaro era o seu coordenador. Eu e o mister Mário Reis fazíamos de asas. O programa era dedicado às questões colocadas pelos tele espetadores do Porto Canal. Obviamente com o futebol como tema dominante.

Ali cheguei a convite do meu amigo Fernando Tavares, na altura o big boss da informação do canal dirigido por Bruno de Carvalho (o do Benfica, não o do Sporting!).

O Gomes Amaro faleceu hoje em Espinho, a cidade onde vivia.

Conhecia-a muito antes do programa que tivemos juntos. Primeiro de ouvi-lo no Quadrante Norte, a estação de rádio que nos brindava com grandes tardes desportivas.Também pensava que o Amaro era brasileiro. Mas não era. O famoso relatador que cantava os golos - o Pateiro veio depois... - era natural de Celorico da Beira (freguesia de Forno Telheiro), ou seja, do Portugal profundo. Foi para o Brasil apenas com três anos e regressou 30 anos depois, trazendo aquele jeito de colorir um jogo de futebol que os ouvidos viam.

Tive a sorte de conhecer grandes relatadores e de fazer parceria com eles. O Amaro foi um, embora na televisão, e o outro foi o Jorge Perestrelo. O Jorge convida-me sempre que me encontrava em jogos internacionais para comentar os seus relatos. Já aqui contei o que aconteceu no célebre Bayer Leverkusen-Benfica do vai à merda, Paneira.

Conheci também outros grandes vozes do relato desportivo. Fernando Correia, David Borges, Ribeiro Cristóvão, Fernando Maciel, o José Alves dos Santos (ainda mais...antigo) e muitos outros. E jamais esquecerei o dia em que, no ano de 2005, recebi o prémio de Repórter do Ano do Record entre pelas mãos de Artur Agostinho, um antigo diretor do 'Record', que vi chorar na minha mesa quando lhe disse que tinha lido o seu livro 'Até na Prisão Fui Roubado'.

Mas também tive a sorte de conhecer a grande geração de radialistas que se seguiu. O Pateiro, o Pedro Azevedo, o Paulo Sérgio, o Fernando Eurico (o meu querido Guedes), o Nuno Matos, o Pedro Cid e muitos outros. Agora está aí mais uma fornada e confesso que já não acompanho a cena de forma a poder fazer uma avaliação mas são certamente também bons relatadores.

Para quem ainda não percebeu, e um percebi bem porque senti de perto, um relato é um disparador de adrenalina que a qualquer nos momentos pode matar. Sempre adorei esse ambiente que nos sugava a alma mas era vida.

Sim, Amaro, estava tudo lá dentro, como dizia o outro. A emoção do futebol e o prazer de estarmos vivos em ondas sucessivas transmitidas no vazio até encher os ouvidos de quem estava do outro lado muitas vezes tendo por única companhia as vozes que chegavam do rádio.