As minhas histórias (4)


Outra estória do Europeu de 84. Só com jornalistas.
O enviado-especial do 'Jornal de Notícias' foi o Luís Alberto Ferreira, um desses jornalistas com registo muito próprio, que valoriza as reportagens com o seu ponto de vista e um ângulo singular de as atacar. Há poucos. O meu pai até lhe chama o "Camilo Castelo Preto", brincando com o facto de ser um homem de África, terra-mãe do bicho homem. Numa das muitas viagens, o Luís, sempre stressado, deixou cair a sua inseparável máquina de escrever nas escadas rolantes. Acontece que era uma daquelas senhoras escadas. Foi "s" para um lado e "ç" para o outro. Tudo desfeito e o Luís desolado com o fim da sua machine. Estávamos no tempo que os nossos dedos não corriam céleres sobre o teclado do computador e que se acamavam às teclas duras das máquinas de escrever, criando músculos de tenista nos nossos braços. Tenho em casa uma "Underwood", que comprei um dia ao Soares Novais. Custou-me uma fortuna mas guarda-o como uma relíquia e com saudade. E sempre que olho para ela lembro-me do Luís e do seu desastre no aeroporto.
Já aqui contei que o José Neves de Sousa foi um dos meus companheiros de viagem. Perto da final, em Paris, a noite acabou tarde. O "Neves" já tinha bebido a sua dose, ou seja, mais ou menos, mas mais para mais, uma garrafa de whisky. Eu não estava propriamente fresco mas ofereci-me para o levar ao hotel. Chamo um táxi e quando volto a olhar para o "Neves" já não o encontro - tinha caído atrás do balcão da recepção. Um esforço e, pronto, eis-nos no táxi. - Neves, qual é o teu hotel? - pergunto. (silêncio) - Neves! Qual é o teu hotel? A resposta, finalmente: - Sei lá. Lembro-me também que o Alves dos Santos, que estava a comentar para a Rádio Renascença, saiu desse europeu com a glória de ter andado de TGV entre Marselha e Paris.
Em 84 os franceses já tinham TGV, vejam só!