RONALDO SÍMBOLO DA CULTURA LUSA


Como muito bem recordou recentemente Almiro Ferreira, o meu jornalista preferido do JN e da Gandra-Herzegovina, Ferguson disse um dia que à mafia de Madrid não vendia sequer um vírus. Pois bem, o Manchester United acaba de vender o madeirense Cristiano Ronaldo por 94 milhões de euros e nesse entretanto o pessoal tem-se preocupado em fazer contas: quanto vale CR 7 em ouro, quantos Ferraris se podiam comprar com esse dinheiro, quantas criancinhas de Etiópia se podiam alimentar... Ao que eu posso acrescentar, como resultado de uma conversa com um responsável por uma OMG, que um simples euro pode pagar a educação de uma africano durante três dias, o que me deixa abismado pois pago todos os meses 500 euros pelo colégio da minha filha depois de ter desistido do ensino público ao fim de 9 professores em dois anos de escolaridade no 1.º ciclo. Sobre este negócio há dois pensamentos mais comuns: uns consideram que é uma barbaridade de dinheiro em tempo de crise; outros dizem que o negócio do futebol é assim mesmo e que as emoções não têm preço (o último que vi a defender esta tese foi Josep Blatter, o vetusto presidente da FIFA).

Eu sei que não querem saber a minha opinião para nada e se querem é para depois puderam destilar veneno na caixa de comentários.

Mesmo assim, arrisco.

O último livro que li foi "A Primeira Aldeia Global", de Martin Page. Um livro sobre a gesta dos portugueses ao longo da história. Confesso que houve partes em que me vieram as lágrimas aos olhos. Não sei o que fizeram a Page durante os oito anos em que viveu em Portugal, os últimos da sua vida, mas deve ter sido coisa boa para que não tenha dúvidas em nos colocar como uma espécie de super-homens da História do Mundo. Só mesmo lendo o livro é que conseguem perceber a dimensão disto.

Por isso, quando vejo Cristiano Ronaldo a rebentar com a escala das transferências e a correr para Los Angeles para ser papado pela Paris Hilton, puxo um Davidoff Gold, olho para as estrelas, deixo-me envolver pelas primeiras brisas de Verão e concordo com Page. Nós portugueses, que colocamos a Madeira a arder durante dois anos quando a quisemos povoar, somos verdadeiramente surpreendentes.

Eu como português revejo-me em Cristiano Ronaldo, no menino madeirense que veio com uma mala de cartão para Lisboa e que se fez craque no Sporting. No craque que zarpou para Manchester e aí ganhou tudo o que tinha para ganhar - inclusivé a confiança do intratável senhor Ferguson.

Mas não gosto só do Ronaldo. Também gosto da mãe do Ronaldo, do padastro, das irmãs, do cunhado e de toda a comandita que o rodeia.

Também gosto do Jorge Mendes, que acaba de ganhar seis milhões de euros com a transferência, e que há pouco mais de dez anos era apenas o dono de um clube vídeo e de uma discoteca em Viana do Castelo.

Eu sei que pode não ser muito politicamente correcto estar aqui a patrocinar esta "obscenidade" que começa no valor do negócio e acaba nos entrefolhos da menina Hilton.

Ok, não importa.

É por causas de histórias como a de Ronaldo que percebemos como é possível que "arigato" seja uma corruptela do nosso "obrigado". Sim, porque quando a Europa descobriu o Japão já lá estavam há muito tempo os portugueses e já se comia tempura, um dos poucos comestíveis pratos da comida nipónica de influência...portuguesa!

Esta notoriedade de Cristiano Ronaldo é histórica. Curiosamente, só os portugueses parecem continuar a não percebê-la. Mais uma vez.