APITO DOURADO (a saga continua)


Madaíl ajuda Valentim


Gilberto Madaíl foi ouvido hoje à tarde no Tribunal de Gondomar, na qualidade de testemunha arrolada pelo Ministério Público. No final de uma audição que durou 20 minutos, o presidente da FPF falou aos jornalistas e reconheceu que o Apito Dourado tem causado "muitos prejuízos" ao futebol português. Para além disso, garantiu que o Conselho de Disciplina da FPF vai decidir "dentro de um mês ou mês e meio" os processos resultados do Apito Dourado nos quais já foram deduzidas notas de culpa. Os ex-dirigentes do Gondomar envolvidos neste processo, o próprio Gondomar SC e 35 árbitros e árbitros assistentes já receberam as respectivas notas de culpa relativas aos processos disciplinares que lhes foram instaurados e podem recorrer a instrução dos mesmos. Em causa está a possibilidade de punições que no caso do Gondomar SC pode incidir na pena de suspensão das competições, o mesmo acontecendo em relação à actividade dos árbitros. Os árbitros que receberam a nota de culpa ou são réus no processo originário ou testemunhas do mesmo, estando no rol um árbitro de 1.ª categoria: Rui Silva. Ao contrário do que já informamos, o árbitro Cosme Machado não recebeu qualquer nota de culpa, estando o seu processo ainda em aberto.O depoimento de Madaíl na sala de audiências foi sóbrio. O presidente da FPF falou sobretudo do processo eleitoral de 2002, por onde passa um dos pontos importantes da acusação. O MP entende que Valentim Loureiro, na qualidade de presidente da Liga, usou os 20 por cento de votos da Liga para assegurar a reeleição de Pinto de Sousa para o Conselho de Arbitragem da FPF, para mais tarde contar com a sua colaboração na nomeação de árbitros para os jogos do Gondomar na época de 2003/2004. Madaíl disse que a Liga estava "fora disto", ou seja, do processo eleitoral e que apenas contou, como é de lei, com uma vice-presidência da direcção. Mais a mais, Pinto de Sousa nem foi a sua primeira escolha e só por ele se decidiu "na última hora", depois de ter sido cogitada a possibilidade de Vítor Pereira ocupar a presidência do Conselho de Arbitragem, hipótese que caiu por terra quando o actual presidente da Comissão de Arbitragem da Liga se associou à lista de Artur Jorge (que acabou por não ir a votos). "O sr. Pinto de Sousa já vinha do passado", referiu, depois de salientar que Valentim Loureiro e o então presidente da Associação de Futebol do Porto, Adriano Pinto, estavam de relações cortadas. Com o seu depoimento, Gilberto Madaíl não revelou qualquer influência de Valentim Loureiro na nomeação de Pinto de Sousa para a presidência do Conselho de Arbitragem, sendo que esta é uma das contrapartidas que o Ministério Público encontrou para acusar ambos neste processo.


O cómico Machado


O árbitro de 1.ª categoria Cosme Machado vai voltar a ser ouvido no Tribunal de Gondomar, depois de aqui ter dito, ontem, que o golo do Gondomar em Paredes, que teria dado o empate a esta equipa, foi bem invalidado. O lance foi visto várias vezes no tribunal e começava num lançamento da linha lateral, com a bola a ser enviada directamente para um jogador do Gondomar que fez o golo, já em tempo de compensações. Alegou Cosme Machado que foi o golo foi bem invalidado pois "a bola raspou num defesa do Paredes" que tentou aliviar, sem sucesso, a bola. Horas depois, o árbitro de Braga reconsiderou e a 12.ª sessão do julgamento começou praticamente com a leitura de uma declaração sua por escrito na qual referia que o golo, afinal, foi mal invalidado, resultando a sua primeira apreciação de uma "confusão", tendo ficado a pensar que a bola, depois do lançamento da linha lateral, tinha tocado primeiro num jogador do Gondomar antes de sofrer o toque que a enviou para as malhas.Pedro Alhinho, advogado de Joaquim Castro Neves, ex-chefe do departamento de futebol do Gondomar SC, entendeu como anómala esta declaração de Cosme Machedo e requereu ao juiz que enviasse uma exposição sobre o acontecimento aos órgãos competentes do futebol, tendo em conta que se trata de um árbitro de 1.ª categoria. O advogado João Medeiros, que defende Pinto de Sousa, também contestou e disse que se impunha nova audição a Cosme Machado. O juiz António Carneiro da Silva entendeu como necessária nova audição da testemunha mas não viu razão para qualquer queixa contra o árbitro aos órgãos desportivos competentes, deixando, porém, essa possibilidade aberta para a defesa de Castro Neves.A primeira testemunha do dia foi precisamente um dos árbitros-assistentes de Cosme Machado. Que, ao contrário do seu chefe de equipa, na véspera, depressa confirmou ao procurador Gonçalo Silva que Cosme Machado também era conhecido pela alcunha de "Collina", embora "não gostasse que o tratassem assim".


Ups!


O procurador do Ministério Público do Gondomar, titular do processo originário do Apito Dourado, pediu para ser extraída uma certidão a propósito de um requerimento do advogado de Castro Neves, Pedro Alhinho, que impediu que no julgamento fossem reproduzidas as respostas de uma das testemunhas - Manuel Silvestre, antigo empregado de mesa do restaurante Margem Douro, onde terão ocorrido alguns jantares/lanches de árbitros com dirigentes do Gondomar - em fase de inquérito. Isto porque Gonçalo Silva, o procurador, entendeu que esta testemunha estava a mostrar "grande divergências" em tribunal em relação ao que tinha dito na fase anterior. Silvestre apresentou-se no tribunal com grandes falhas de memória e nem se recordava do preço da lampreia há quatro anos. Aliás, seria mesmo o advogado de Castro Neves a fornecer ao tribunal um menu actual do restaurante visado, onde se pode ler que uma lampreia custa 80 euros, sendo que, segundo Silvestre, "para cinco pessoas aconselhava sempre duas lampreias".No seu requerimento para justificar o recurso às declarações de Silvestre na fase de inquérito, o advogado Pedro Alhinho referiu que o inquérito conduzido pela Polícia Judiciária não teve o objectivo de apurar factos que tivessem a ver com a verdade desportiva mas sim, apenas, "e cirurgicamente", "na situação de putativa lesão da verdade desportiva alegadamente praticada em benefício do Gondomar SC". Com isto querendo dizer que a investigação foi direccionada e desprezou outros factos semelhantes que podiam também comprometer outros clubes.Face a esta posição, o procurador Gonçalo Silva pediu que destes factos seja extraída uma certidão para apurar "um eventual crime de denegação de justiça ou prevaricação", a apreciar possivelmente por um tribunal superior. Pedro Alhinho reagiu, manifestando a intenção de constituir-se assistente neste eventual processo


Pierluigi Cosme


O árbitro bracarense Cosme Machado, da 1.ª categoria nacional, pôs a sala de audiências a rir quando respondeu assim à pergunta, do procurador Gonçalo Silva, ‘por que razão é tratado por Collina?’: “Não sei, se calhar o Collina é que é conhecido por Cosme!” Logo acrescentando: “Não sou assim tão feio...” O juiz António Carneiro da Silva pediu de imediato contenção na ironia e a verdade é que Cosme Machado não precisa de palavras para justificar a alcunha. Que o procurador do MP queria ver detalhada a propósito de uma escuta entre José Luís Oliveira e Pinto de Sousa, na qual se fala no Collina português como árbitro a nomear para o jogo Paredes-Gondomar. Partida que o Gondomar perdeu e de que saiu com razões de queixa. Ontem, pela primeira vez viram-se imagens de jogos no tribunal de Gondomar. De qualidade sofrível e com falhas técnicas. Ainda assim, deu para ver o Gondomar a marcar um golo, no tal jogo de Paredes, na sequência de um lançamento da linha lateral, com o árbitro a assinalar fora-de-jogo! E a explicar assim a decisão: “A bola terá raspado primeiro num defesa do Paredes”. Oliveira e Castro Neves “passaram-se” enquanto o juiz dava por encerrada a audiência.


Voz de prisão


Fausto Marques é árbitro e agente da PSP. Na época de 2003/2004, acompanhou o árbitro lisboeta Valente Mendes em 3 jogos que o Gondomar SC disputou fora de casa, um deles no recinto dos Dragões Sandinenses. Interpelado pelo juiz António Carneiro da Silva, Marques disse que jamais foi alvo de qualquer tentativa de aliciamento. "A quem o fizesse daria de imediato voz de prisão", referiu.No caso concreto dos jogos em análise (para além da partida com os Dragões, jogos com o Trofense e o Vilanovense), Fausto Marques contou um episódio curioso. No final do jogo da Trofa, que o Gondomar ganhou, foi convidado, tal como os seus colegas, para jantar com os dirigentes do Gondomar. Mas a equipa de arbitragem recusou o convite pois já tinha sido convidada para jantar pelos dirigentes da equipa da casa, como terá acontecido.Quanto às ofertas que podem vir a constituir-se como uma das contrapartidas oferecidas aos árbitros, Fausto Marques confirmou que nos 3 jogos do Gondomar recebeu artefactos em ouro mas frisou também que recebeu um relógio "Camel" dos Dragões Sandinenses. Para além de canetas com o símbolo do Trofense.Este árbitro foi também irónico quando falou no perito Jorge Coroado, que analisou um dos jogos em causa, não tendo visto razão para grande penalidade a favor do Gondomar no jogo com os Dragões (que terminou empatado a uma bola). "O senhor Jorge Coroado na Sport-TV comenta um lance de uma maneira no momento e após a repetição comenta-o de outra", salientou este agente da PSP que neste momento integra uma equipa de arbitragem chefiada por um inspector da Polícia Judiciária. Que recordou como última oferta duas sandes de couratos e um sumo.


Os relógios de Sandim

Nuno Fraguito fazia parte da equipa do árbitro vilarealente Rui Silva, hoje na 1.ª categoria, na época de 2003/2004. Nessa temporada, esteve em dois jogos do Gondomar e noutros tantos dos Dragões Sandinenses. No caso dos jogos do Gondomar, revelou no tribunal que a equipa de arbitragem aceitou uma primeira oferta, que constava de um fio de ouro e uma cruz, artefactos que Fraguito ainda guarda em casa e que avaliou em 142 euros. Pouco mais que o valor do relógio "Timex" que disse ter recebido, nessa época, dos Dragões Sandinenses: 110/120 euros.Segundo Nuno Fraguito, a recusa, numa segunda ocasião, daqueles que chamam lembranças do Gondomar, foi uma iniciativa do seu chefe de equipa. Porque se entendeu que "se calhar" era ouro a mais, tratando-se de uma lembrança "aparentemente valiosa". Interpelado pelo advogado-árbitro Carlos Duarte sobre se não era normal os árbitros receberem produtos típicos da região onde se disputavam os jogos - no caso de Gondomar, capital da filigrina -, Fraguito disse que para ele receber um fio de ouro ou um queijo da serra é a mesma coisa. Tendo a advogada Fátima Castro referido depois se é de bom tom um árbitro, por exemplo, recusar os típicos chapéus madeirenses quando arbitra jogos naquela ilha. "Se o fizermos, as pessoas tomam tal por ofensa", reagiu Fraguito.Os advogados de defesa voltaram a tocar na tecla dos relógios que aparentemente os Dragões Sandinenses - grande rival do Gondomar na época investigada - ofereciam aos árbitros. "Tem conhecimento de em Sandim se fabricarem esse tipo de relógios?", foi a pergunta lançada pelo advogado Pedro Alhinho, que defende Joaquim Castro Neves. Com a defesa a marcar pontos ao conseguir demonstrar que não era apenas o Gondomar que oferecia lembranças mas também os seus adversários, sendo que o Gondomar oferecia o símbolo produtivo do concelho - artefactos de filigrana.


O que comeram?


Começou a 11,ª audiência do julgamento do processo originário do Apito Dourado. A primeira testemunha do dia foi o árbitro-assistente Ângelo Ferreira, que pertencia à equipa do árbitro leiriense Licínio Santos. Pela primeira vez neste julgamento, coube ao procurador Carlos Teixeira - o grande motor deste processo - questionar as testemunhas, na ausência do procurador Gonçalo Silva. Teixeira revelou um estilo incisivo, em claro contraste com a serenidade do seu colega que é o procurador titular do processo neste julgamento.Em causa estavam os jogos do Gondomar com o Vizela e com o Infesta, na época de 2003/2004, e Carlos Teixeira procurou saber se nuim dsses jogos - Vizela - porque razão o árbitro mostrou 6/7 cartões amarelos a jogadores do Vizela e nenhum a jogadores do Gondomar, expulsando pelo meio um jogador vizelense. Não houve resposta concreta para este caso, tendo sido esmiuçado esse lance pelo procurador, que tentou saber se não tinha sido pisado antes de dar uma chapada que determinou a expulsão do terreno do jogo.Ângelo Ferreira confirmou que no final do jogo com o Infesta foi jantar a um restaurante de Gondomar com outra equipa de arbitragem - a de Pedro Sanhudo - e dirigentes do Gondomar SC.. Aí chegados, Teixeira disparou perguntas de rajada:- O que comeram?- Lampreia.- E gostou?- Nem por isso.- Sabe quanto custa a lampreia?- Não.- E quem pagou o jantar?- Penso que foi o meu chefe de equipa, até se levantou e disse que ia ao balcão...Mas importante mesmo foi a revelação do árbitro-assistente de que a equipa de arbitragem tinha recebido camisolas do Gondomar SC com os nomes dos árbitros nas costas. O mesmo aconteceu a seguir com Patrick Pinho, ex-árbitro assistente também da equipa de Lícínio Santos. Que até mostrou a camisola que o Gondomar lhe ofereceu a seguir ao Vizela-Gondomar, com o seu primeiro nome nas costas.

Afinal havia ouro


A sessão da tarde de hoje do julgamento do processo originário do Apito Dourado começou com o testemunho do árbitro assistente José Leão Duarte, integrante da equipa de Rui Mendes no jogo Trofense-Gondomar, o ponto zero deste processo. Duarte não se lembra se houve ofertas de ouro nesse jogo, apenas soube dizer que por vezes recebia prendas, dando como exemplo um...fato. "Lembrança" até agora nunca citada num rol que inclui garrafas de vinho, galhardetes, camisolas, queijos e até fogaças.O mais importante testemunho da tarde foi protagonizado por Miguel Oliveira. Este maquinista de Canelas (Gaia) fazia parte da equipa de Sérgio Pereira, o árbitro que mostrou um apito dourado em plena sala de audiências. E que, tal como outros dos seus assistentes (Ivan Vigário, ouvido de manhã), confessou que nesse jogo não recebeu qualquer prenda em ouro. Pois bem, Miguel Oliveira disse em tribunal que nesse jogo a equipa de arbitragem foi presenteada com 3 caixinhas com uma volta de ouro cada uma. "Foi a primeira que me ofereceram este tipo de objectos", disse esta testemunha. E relógios, não recebeu? - perguntou um dos advogados de defesa. "Falava-se que uma equipa dava relógios: os Leões da Agra", respondeu.Licínio Tavares, árbitro assistente do ex-árbitro Aníbal Gonçalves (acusado mas não pronunciado), foi a última testemunha de uma dia de julgamentO inesperadamente curto, concluído pouco depois das 14 horas. Questionado pelo advogado/árbitro Carlos Duarte, que defende António Eustáquio e Jorge Saramago, Tavares confirmou a oferta de fogaças pelo Feirense mas o mesmo não fez em relação a pequenos objectos em prata que aquele clube eventualmente oferece às equipas de arbitragem, como foi sugerido por Carlos Duarte. "Mas penso que sim, que ofereciam", adiantou o árbitro assistente.


Camarão havia sempre

Está a decorrer a 10.ª sessão do julgamento do processo originário do Apito Dourado, relativo aos jogos do Gondomar SC na época de 2003/2004. A sessão começou com o testemunho de Paulo Nobre, árbitro assistente da equipa de Fernando Valente, árbitro detido no dia 20 de Abril de 2004, constituído arguido mas não acusado. Nobre considerou "normais" os jogos em causa neste processo - Taipas-Gondomar e Gondomar-Fafe - e confirmou que no final de um desses jogos recebeu do presidente do Gondomar "uma fieira", ou seja, um fio de ouro. O que era "só uma lembrança".Seguiu-se José Manuel Fernandes, árbitro assistente já retirado, também da equipa de Fernando Valente. Que confirmou que depois do Gondomar-Fafe o delegado ao jogo do Gondomar, Castro Neves, ofereceu à equipa de arbitragem uns pequenos embrulhos. "Meti o meu no saco e foi a minha mulher quem o tirou em casa, verificando que era um fio de ouro, aliás, ainda anda com ele ao pescoço", referiu esta testemunha.Ivan Vigário, árbitro actualmente na 2.ª categoria, integrava a equipa de Sérgio Pereira (o árbitro que, em pleno tribunal de Gondomar, mostrou um apito dourado), e confirmou que o seu chefe de equipa foi abordado por Castro Neves no balneário no sentido de atender um telefonema do então presidente do Gondomar, José Luís Oliveira. Quanto a prendas, disse que nada recebeu, embora noutros jogos tivesse recebido camisolas, queijos, relógios e até garrafas de vinho.Por fim, foi ouvido Tomás Santos, árbitro assistente de 1.ª categoria, em 2004 integrante da equipa de José Manuel Rodrigues, um dos 24 réus. Interpelado por um dos juízes asa, Santos confirmou que depois do jogo Gondomar-Freamunde a equipa de arbitragem foi lanchar com os dirigentes do Gondomar, Castro Neves e José Luís Oliveira. "Mas foi o nosso chefe de equipa quem os convidou no final do jogo, tendo-lhes dito que ninguém ia ficar chateado por causa de um lance do jogo", revelou. Santos disse que o local do lanche, um restaurante de Gondomar, foi escolhido pelos dirigentes locais pois conheciam a zona. Quanto ao menu, não conseguiu ser exacto mas "camarão foi de certeza porque camarão havia sempre". E quem pagou? "Penso que foi o árbitro", respondeu Tomás Santos.