AZERT


Ainda sou do tempo em que o chefe num jornal era um tipo respeitado e até venerado. Como numa tribo de Sioux ou Apaches. Era o chefe e ponto. O resto da maralha batia a bola baixo e trabalhava. Admito que os tempos mudaram mas continuo sem trocar o carismo e o mito do chefe pelos novos modelos de liderança, disponíveis numa prateleira de uma FNAC perto de si. Estou convencido que esta espécie de gurus ganha bem a vida enganando a clientela de forma um tanto ou quanto descarada, ao estilo dos vendedores de chaves da sorte para o euromilhões. Vem isto a propósito exactamente de alguns momentos de saudável anarquia que tive oportunidade de viver na minha carreira, como aconteceu na Gazeta dos Desportos, quer na rua de S. João, quer na rua Poço dos Negros, no Porto e em Lisboa, respectivamente. O culpado deste rivalismo é o Paulo Silva, que hoje motivou a conversa de treta no msn, e o Paulo é um tipo que tenho sempre em conta, sobretudo depois daquela cena do mapa de folgas (mas aí era eu que me estava a armar em...chefão, coisa que, de facto, não me está nos genes). Na rua de S. João, recordo 3 episódios: o mistério do cu gravado no pó da banheira; a energia cinética do elefante de porcelana do Augusto Martins; e o pau do telecomando que o Paulo Montes elegeu como símbolo do seu poder. Há outros mas destaco estes. Em Lisboa, na Poço do Negros, não esqueço os jogos de ping-pong depois do fecho da edição, com blocos a improvisar raquetas e livros a fazer de rede; os encharcados ao Óscar quando era voltava do escritório que era a tasca do andar de baixo; e a famosa caça à ratazana, para não falar no sofá onde o Bonzinho dormia ou para o cagalhão que um dia o Mário Pereira depositou na gaveta de uma secretária de uma dama pela qual o Luís Graça se apaixonou. Como dá para imaginar, foi um tempo glorioso, exactamente porque não havia...chefe, ou se havia ninguém notava. Tá bem, tínhamos lá o Virgílio Neves com as suas histórias americanas, o Tó Pasteleiro com a basófio do costume e o velho Viriato a fazer de conta que não achava piada à energia da canalhada. O comandante Barquinho, esse, também fazia de conta que não percebia que havia um motim permanente na Bounty. A verdade é que o jornal respeitava os fechos e vendia sem precisar de recorrer a técnicas de liderança, campanhas de marketing ou lições de moral (das 3 a pior). Bons tempos. Bons velhos tempos do jornalismo em azert.